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Martin Bucer: Um dos Grandes Reformadores

Por: Keith Mathison


Escrevendo em 1539, João Calvino descreveu Martin Bucer como um homem “que por causa de sua profunda erudição, seu abundante conhecimento sobre uma ampla gama de assuntos, sua mente perspicaz, sua vasta leitura e muitas outras diferentes virtudes, ainda hoje permanece insuperável por qualquer pessoa, pode ser comparado apenas a alguns, e se destaca dentre a grande maioria”. Calvino escreveu estas palavras durante a sua estadia de três anos em Estrasburgo (1538-1541), onde Bucer foi um reformador proeminente. Depois de sua chegada à cidade, Calvino morou por um tempo na casa de Bucer antes de se mudar para uma casa vizinha. Durante esse tempo, os dois reformadores se tornaram próximos, e Bucer influenciou muito seu colega mais novo. No entanto, apesar da estreita ligação entre Bucer e Calvino, Bucer permanece como um desconhecido para muitos cristãos reformados, relegado ao papel de um reformador secundário.

A biografia de Bucer por Martin Greschat foi originalmente publicada em alemão em 1990. A tradução para o inglês por Stephen Buckwalter e a publicação por Westminster John Knox, em 2004, foi a primeira biografia de Bucer em inglês em setenta anos. Martin Greschat é professor universitário de História da Igreja e Temas Contemporâneos da Igreja em Justus-Leibig-Universität Giessen, na Alemanha. Ele escreveu uma série de artigos acadêmicos sobre a vida e o pensamento de Bucer, sendo bem qualificado para escrever uma biografia completa.

Martin Bucer nasceu em 1491 na cidade de Sélestat, uma cidade livre e imperial na Alsácia (atual nordeste da França). Ele se uniu à Ordem dos Pregadores, ou Dominicanos, como noviço em 1507. Após um ano, ele fez votos de pobreza, castidade e obediência, tornando-se um monge dominicano. O estágio inicial de seus estudos consistiu em estudo aprofundado de Aristóteles. Os dominicanos consideravam o estudo de Aristóteles como culminando no estudo da teologia, e Bucer seguiu esse caminho educacional. Ele visitou Heidelberg em 1515 e Mainz em 1516 para continuar seus estudos bíblicos e teológicos. Enquanto esteve em Mainz, Bucer foi ordenado sacerdote. Em janeiro de 1517, ele retornou a Heidelberg para obter um diploma universitário. Em 1518, ocorreu um evento em Heidelberg que mudaria o curso da vida de Bucer para sempre.

Em abril de 1518, Martinho Lutero chegou a Heidelberg para um debate. Bucer estava presente. Em seu debate Lutero “afirmou a incapacidade do homem de fazer o bem, negou o livre arbítrio, estabeleceu uma nova compreensão da teologia baseada na cruz e proclamou a salvação pela fé em Cristo somente”. Bucer demonstrou interesse especial na primeira tese de Lutero: “A lei de Deus, a mais salutar doutrina de vida, não pode conduzir o homem no caminho da justiça, mas sim o impede”, e sua vigésima quinta tese: “Não é justo aquele que pratica muitas obras, mas aquele que, sem obra, muito crê em Cristo”. Bucer concordou com o que Lutero disse, mas ele tinha uma visão mais ampla da lei. Os cristãos, ele argumentou, se relacionam com a lei de uma nova maneira. O entendimento de Bucer sobre a lei, como Greschat o resume, é que os cristãos “consentem com a lei em seus corações e são movidos pelo Espírito Santo a viver e agir de acordo com ela” (p. 28). Bucer percebeu as implicações de seu acordo com Lutero. Em 30 de abril de 1518, ele elaborou um testamento formal e um inventário de todos os seus livros.

Em 1521, Bucer recebeu dispensa de seus votos dominicanos e, em 1522, casou-se com uma ex-freira, Elisabeth Silbereisen. Em maio do mesmo ano ele aceitou o chamado para ser pastor na cidade de Landstuhl. Depois de trabalhar para a Reforma por seis meses, Bucer foi a Wissembourg, em novembro de 1522. Bucer pregou as doutrinas da Reforma de modo implacável. Isso não foi bem recebido pelos habitantes da cidade e a oposição aumentou. Eventualmente, Bucer foi excomungado e o conselho da cidade solicitou que ele deixasse a cidade. Foi nessa condição, como um sacerdote refugiado e excomungado, que Bucer chegou a Estrasburgo em 1523. Bucer lideraria a Reforma em Estrasburgo durante os vinte e cinco anos seguintes. Entre 1523 e 1549, quando foi exilado mais uma vez, Bucer seria uma figura fundamental na Reforma Protestante.

Um dos debates centrais durante o tempo da Reforma dizia respeito à doutrina e à prática da Ceia do Senhor. Muito cedo, surgiu uma divergência entre Lutero e os reformadores suíços, como Ulrico Zwínglio e Johannes Oecolampadius. Esta divisão não criou apenas problemas teológicos e eclesiásticos, mas também políticos. Os exércitos do imperador romano Carlos V eram uma ameaça para as cidades e para as regiões que se converteram à causa da Reforma. Os desentendimentos sobre a Ceia do Senhor entre os Protestantes levaram não somente a divisões eclesiásticas, mas também a divisões políticas, as quais enfraqueciam as cidades protestantes política e militarmente. Bucer dedicou grande parte de sua energia à tarefa de encontrar um modo de reconciliar os Luteranos e os Suíços. Seus esforços resultaram em vários documentos importantes. Por exemplo, ele é co-autor da Confissão Tetrapolitana na tentativa de promover reconciliação. Suas opiniões sobre a Ceia do Senhor influenciaram Calvino, que também tomou uma posição de mediação entre os Luteranos e os Zwinglianos.

Em sua biografia sobre Bucer, Martin Greschat discute estes e muitos outros eventos, incluindo os últimos anos de Bucer na Inglaterra depois de ser exilado de Estrasburgo. Se alguém admira Bucer ou considera os seus esforços pela unidade teologicamente equivocados e/ou ingênuos, esta biografia é digna de ser estudada. Há muitas obras sobre a Reforma como um todo, e algumas destas obras demonstram uma extraordinária erudição. Todas, no entanto, tendem a sofrer o mesmo defeito inevitável. As histórias sobre a Reforma como um todo são forçadas pela própria natureza a envolver uma grande quantidade de material, o que as impede de se concentrarem intensamente no dia a dia do trabalho realizado por aqueles que estavam envolvidos nesse momento decisivo da história. Tais obras gerais são necessárias, mas devem ser complementadas com livros como a biografia de Bucer por Greschat. Isso é necessário porque muitos estudantes da Reforma veem os escritos e debates da Reforma em um vácuo. Eles não levam em consideração os inúmeros fatores políticos, sociais, culturais e outros que afetaram os reformadores e o seu trabalho.

Greschat faz um trabalho magnífico atraindo leitores para o mundo do século XVI. Os leitores desta biografia recebem um vislumbre fascinante daqueles anos tumultuados a partir da perspectiva de um ator significativo nos eventos. Vemos as manobras políticas dos príncipes, conselhos de cidades, reis, reformadores e bispos. Vemos os efeitos que as crises econômicas e as doenças mortais exerceram sobre a Reforma. Vemos o cotidiano de ganhos e perdas daqueles que buscaram chamar a Igreja de volta à Escritura. Bucer certamente não era perfeito, e Greschat aponta as suas falhas. Contudo, ele foi uma parte fascinante e importante da Reforma do século XVI. Felizmente, Martin Greschat forneceu à igreja uma bela biografia desse reformador esquecido.

Por: Keith Mathison. © Ligonier. Website: ligonier.org. Traduzido com permissão. Fonte: Martin Bucer: A Reformer and His Times

Original: Martin Bucer: Um dos Grandes Reformadores. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Camila Rebeca Teixeira. Revisão: William Teixeira.

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