Lucas, autor do Evangelho e de Atos dos Apóstolos, nos ajuda muito no sentido de esclarecer como o texto deve ser interpretado.
Em Atos 1:15 o texto diz que naquela ocasião havia “quase cento e vinte pessoas” quando Pedro tomou a palavra para a eleição de um apóstolo que substituísse Judas. O capítulo 2:1 começa assim: “E, cumprindo-se o dia do pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar;” O texto , aqui não diz se eram os cento e vinte ou os doze. Mas deixa claro que foi num outro dia, “Cumprindo-se o dia do pentecostes…” Em Atos 2:14 diz: “Pedro, porém, pondo-se em pé com os onze”… Para alguns pode fazer diferença, se foram cento e vinte ou doze. Pedro, mais onze, igual a doze. Creio que é um assunto no qual não adianta se deter.
No mais o estudo ficará no contexto em Atos, e no uso das palavras gregas: glôssa e diálektos. Lucas usa a palavra glôssa 6 vezes no seu livro, enquanto que a palavra diálektos é usada também 6 vezes. Destes usos só Atos 2:26, fala da língua como membro do corpo humano. E Atos 2:3 fala da representação do Espírito Santo ao descer sobre os apóstolos, “E foram vistas por eles línguas(glóssai) repartidas…” E Atos 1:19 fala de diálekto, como idioma dizendo: “de maneira que na sua própria língua (diálekto) esse campo se chama Acéldama, …” , não tendo nada a ver com nosso estudo, a não ser o fato de Lucas usar a palavra diálekto para idioma.
Em Atos 2:4,11; 10:46; e 19:6; é usada a palavra glôssa. Enquanto que a palavra diálekto, é usada em: 2:6,8; 21:40; 22:2; e 26:14. Conferindo os textos veremos que Lucas usa a palavra glôssa quando se fala de língua estranha. E usa a palavra diálekto, quando quer falar de idioma. Com uma exceção, se eu posso dizer assim, pois não sei o que Lucas pensava naquele momento. Atos 2:11parece que está falando de idioma e não de língua estranha: “Cretenses e árabes, todos os temos ouvido em nossas próprias glóssais falar das grandezas de Deus.”
Em Atos 2:4 diz: “E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas (glóssais), conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem.” Este texto sozinho não pode ser interpretato ele precisa do restante do texto. Depois deste versículo, somente no versículo 11 reaparece a palavra línguas (glóssais), mas que não pode ser traduzido por “língua estranha” em virtude do seu contexto. A tradução óbvia é: idioma. Veja o texto: “Cretenses e árabes, todos os temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus.”
Neste capítulo, ainda temos os versículos que falam em idioma: Atos2:6 e 8: “E, correndo aquela voz, ajuntou-se uma multidão, e estava confusa, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua(dialékto).” “Como pois os ouvimos , cada um, na nossa própria língua(dialékto) em que somos nascidos?” Nos dois versículos, também fica claro que se fala de idioma.
Vejam, estou sendo simples como o texto. Agora, como podemos entender a situação como um todo, deste capítulo. As línguas estranhas foram um sinal? Como provamos, com um texto apenas, que foram línguas estranhas? Este fato não será provado aqui, mas depois. Como já foi dito, não há dúvida que Lucas fala de idiomas ao usar a palavra diálekto. Mas isso também pode ser debatido. Então vamos deixá-los quietos e tanger um outro assunto, usando como premissa, que estas duas palavras são usadas no sentido dado acima.
Se eram línguas estranhas, ou ininteligíveis, como o povo os ouvia no seu próprio idioma? Vejamos algo interessante: Atos 2:6 “…cada um os ouvia falar…” 2:8 ”Como pois ouvimos,…” 2:11 “…todos os temos ouvido em…”. Pela fala do povo, os discípulos não estavam falando em língua estranha, mas nos idiomas deles. Era assim que eles ouviam. O que não significa que os discípulos não estivessem falando em língua estranha.
Outro detalhe: As pessoas que estavam entendendo o que eles diziam se maravilhavam disso. Estavam abertos para ouvir. Não estavam preconcebidos. E as pessoas preconcebidas não entendiam nada. Para estes os discípulos não falavam em idiomas. Por isso zombavam e diziam que estavam bêbados, ou loucos.
O que significa isso? Significa o que, pelo menos dois comentaristas, dizem que pode ter acontecido. Que na ocasião houve três fatos importantes: o derramamento do Espírito Santo, o falar línguas estranhas pelos discípulos, e a interpretação das línguas pelo Espírito Santo às pessoas que de coração aberto e perplexos queriam saber o que estava acontecendo. Convenhamos, deixaria Deus faltar alguma coisa, para que o fato não pudesse ser entendido e o seu nome glorificado? Para nós pode parecer algo grandioso demais, mas sabemos que para Deus não é. Para Deus isso foi simples. Muito simples.
Seguimos para Atos 10:44-46 “E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra. 45 E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios. 46 Porque os ouviam falar glóssais, e magnificar a Deus.” Por que os “da circuncisão” sabiam que havia sido derramado o Espírito Santo? “Porque os ouviam falar línguas (glôssa)” . Se estes estivessem falando em outros idiomas, seria um sinal? Lucas poderia ter usado a palavra diálekto. Certamente não quis dificultar o entendimento do texto.
E Pedro usa este fato para dar testemunho em Jerusalém, de que os gentios haviam recebido o Espírito Santo. Atos 15:8 “E Deus, que conhece os corações, lhes deu testemunho, dando-lhes o Espírito Santo, assim como também a nós.” “Lhes deu testemunho”. “Lhes deu um sinal”. Um sinal não somente para os gentios, mas para os judeus que lá estavam e para Pedro, que pregava. Se eles falassem em idiomas, seria um sinal? Em Cesaréia, cidade importante em todos os sentidos: comercial e político. Havendo pessoas de todos os lugares. Por isso glôssa e não diálekto.
Seguimos para Atos 19:5-7. “E os que ouviram foram batizados em nome do Senhor Jesus. 6 E, impondo-lhes Paulo as mãos, veio sobre eles o Espírito Santo; e falavam glóssais e profetizavam. 7 E estes eram, ao todo, uns doze varões.” Novamente, Lucas não usa diálekto, isto é idioma. Apesar de não haver argumento maior, o uso da mesma palavra pelo evangelista, nos dá a entender que falaram em línguas estranhas.
Seguimos para Atos 21:40 “ E, havendo-lhe permitido , Paulo pondo-se em pé nas escadas, fez sinal com a mão ao povo; e, feito grande silêncio, falou-lhes em dialékto hebraico.”
Sigamos logo para Atos 22:2 “(E, quando ouviram falar-lhes em dialékto hebraico, maior silêncio gurdaram.)
Sigamos logo para: Atos 26:14 “E, caindo nós todos por terra, ouvi uma voz que me falava, e em dialékto hebraico, dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? Dura coisa te é recalcitrar contra os aguilhões.”
Há aqui alguma dúvida de que está se falando de idioma? Certamente não. Porque o texto cita o idioma. E estes textos foram escritos pelo mesmo autor dos outros textos, onde se usa a palavra glôssa. Por que Lucas faria o esforço de usar termos diferentes sem ter um motivo para isso? Tanto em Atos 2, como em 10, e 19, ele usa o mesmo termo. Por que eu traduziria, ou interpretaria de forma diferente?
Não preciso atender problemas eclesiásticos, ou religiosos (o que é muito pior), para amoldar um texto ao desejo de um grupo que não consegue ver Deus como um Deus livre e que pode fazer até coisas que eu não quero. Mas que vão contribuir para a divulgação do evangelho. Quem sou eu, ou melhor dizendo, como Deus perguntou a Jó 28:4ª “Onde estavas tu, quando eu fundava a terra? Faze-mo saber, se tens inteligência.”
Precisamos ressaltar, que em nenhum lugar deste livro é falado sobre a repetição de qualquer um destes eventos. Digo: qualquer um, porque todos foram diferentes. Em Atos 2, foi o derramamento do Espírito Santo, propriamente dito, conforme promessas de Jesus em João 14 e 16. Já na casa de Cornélio, não houve um derramamento do Espírito Santo, mas uma manifestação do Espírito Santo, que já havia sido derramado em Atos 2. O mesmo acontece em Éfeso. As situações também foram diferentes: Em Atos 2, os discípulos receberam o Espírito Santo manifesto em línguas de fogo pousando sobre cada um deles, para prova para eles mesmos do que estava acontecendo. Em Cesaréia, a manifestação aconteceu enquanto Pedro falava, diríamos que ele ainda não havia feito o apelo para crer em Jesus; não temos certeza se todos os presentes já haviam crido. Mas foi uma prova para os judeus e para Pedro. E em Éfeso, os discípulos já haviam sido batizados com o batismo do arrependimento de João Batista, eles foram, pois, batizados em nome de Jesus, e depois Paulo impondo as mãos, receberam o Espírito Santo
Tendo estes três textos, também não encontramos em nenhum deles, ou num outro de Atos que é necessário que o novo convertido fale em línguas estranhas. Quando Pedro foi perguntado em Atos 2:37-38 “… Que faremos varões irmãos?” Pedro respondeu “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo.” Que ocasião propícia para falar que deveriam falar em língua estranha, se isso fosse necessário. O versículo 42 diz que se converteram “quasi três mil almas.” E não fala nada em alguém ter falado em línguas estranhas. Da mesma forma em Atos 4:4 onde se converteram “Muitos, porém, dos que ouviram a palavra creram, e chegou o número desses homens a quasi cinco mil.” Destes também não se fala que alguém tivesse falado em línguas estranhas. E só mais um exemplo: Nem o apóstolo Paulo, indo a Damasco, tendo visto a forte luz, ouvindo Jesus falar com ele, não falou em língua estranha, apesar de ter sido um momento muito divino. Ainda Paulo, quando recebeu a visita de Ananias. Ananias diz que ele fora enviado para que Paulo “tornes a ver e sejas cheio do Espírito Santo”. Nem mesmo neste momento Paulo falou língua estranha. Diz o texto que “levantando-se foi batizado.”
#FéReformadaPuritana
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